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1 de janeiro de 2020

O Direito Real de Habitação Duradoura

CIVIL
O Direito Real de Habitação Duradoura

Decreto-Lei n.º 1/2020 de 09 de janeiro

 

A Habitação em Portugal, especialmente nas grandes cidades, está na ordem do dia, e a mais recente inovação surge com o nascimento de uma nova figura jurídica, denominada Direito Real de Habitação Duradoura (DHD).

 

Assim, a 05 de Setembro do ano transato o Governo aprovou o decreto-lei que entraria em vigor a 10 de Janeiro de 2020 e fez saber que com este se pretende “criar uma solução habitacional alternativa, que compatibiliza a necessidade de segurança e estabilidade com a flexibilidade adequada aos percursos pessoais e familiares, que reduz significativamente o endividamento das famílias e que, por outro lado, constitui um modelo de rentabilização dos imóveis atrativo para que os proprietários os disponibilizem para esse fim, aumentando a oferta habitacional.”

 

O Decreto-Lei n.º 1/2020 de 9 de janeiro, estabelece que o DHD faculta a uma ou a mais pessoas singulares o gozo de uma habitação alheia como sua residência permanente por um período vitalício, mediante o pagamento ao respetivo proprietário de uma caução pecuniária e de contrapartidas periódicas[1].

 

Da leitura deste decreto lei resulta claro que o mesmo pretende oferecer aos arrendatários a segurança de poderem habitar a mesma casa, sem o risco associado aos prazos do arrendamento, entregando como contrapartida uma caução e uma prestação mensal.

 

Adicionalmente, este regime permite ao morador, vir a adquirir a habitação se assim o pretender, utilizando para tal, o montante pago a título de caução[2].

 

A referida caução (artigo 6.º) é prestada em dinheiro e no montante que deve corresponder ao intervalo entre 10% e 20% do valor mediano das vendas por m2 dos imóveis destinados à habitação, na freguesia do imóvel em causa, tendo em conta as atualizações divulgadas pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).

 

Existem ainda formalidades associadas à constituição do DHD que vale a pena conhecer:

 

i) o imóvel é sujeito a uma avaliação prévia (art.4.º) que o proprietário deve promover a expensas suas;

 

ii) O DHD é sujeito a forma especial – ou seja, celebrado por escritura pública ou por documento particular no qual as assinaturas das partes são presencialmente reconhecidas[3].

 

iii) o documento pelo qual se constitui o direito deve conter, ainda:

 

(a) montante da caução prestada e os valores das contrapartidas,

 

(b) declaração do morador a aceitar o estado de conservação da habitação, determinado de acordo com a ficha de avaliação; e

 

(c) endereço postal e, se as partes assim o pretenderem, o endereço eletrónico que cada uma delas se compromete a utilizar para efeito de todas as comunicações a realizar no âmbito do DHD;

 

Cumpridas estas formalidades, o morador tem 30 dias para promover e suportar os custos do pedido de registo predial.

 

Enquanto dure o DHD (que se extingue apenas com a morte do morador, por renuncia deste[4], ou por via de resolução do contrato em caso de incumprimento[5]) o proprietário conserva algumas obrigações, com destaque para (i) o pagamento “na parte relativa à habitação, os custos de obras e demais encargos relativos às partes comuns do prédio e, no caso de condomínio constituído, pagar as quotizações e cumprir as demais obrigações enquanto condómino”, (ii) o “assegurar a vigência, a todo o tempo, de seguros relativos ao prédio e à habitação que sejam legalmente obrigatórios”[6].

 

Já o morador deve (i) cumprir pontualmente com os pagamentos associados ao DHD (nomeadamente a prestação mensal, as taxas municipais e entregar ao proprietário do imóvel os montantes relativos ao Imposto Municipal sobre Imóveis) (ii) utilizar a habitação exclusivamente para sua residência permanente[7]; (iii) Realizar e suportar o custo das obras de conservação ordinária na habitação; (iv) consentir ao proprietário a realização das obras a que este está obrigado – cfr. resulta do Artigo 9.º e ainda, a cada oito anos remeter ao proprietário uma ficha de avaliação atualizada, ou permitir-lhe o acesso ao imóvel para esse efeito[8].

 

Este regime apresenta algumas vantagens para ambas as partes, não deixando simultaneamente de apresentar desvantagens.

 

No caso do senhorio, é certo que este obtém uma fonte segura de rendimento e que, em caso de incumprimento se encontra caucionada, vendo ainda reduzidos os custos com o imóvel. No entanto, o perfil do morador tem de ser considerado com especial cautela sendo que disponibilidade sobre o imóvel é substancialmente reduzida[9], uma vez que o proprietário só poderá resolver o contrato unilateralmente em caso de incumprimento.

 

Por outro lado, ao morador é conferido o direito de viver “permanentemente” no imóvel se assim o entender, sem se ver obrigado a recorrer ao financiamento bancário para assegurar esta tranquilidade, no entanto, assume obrigações (de pagamento nomeadamente) que nunca teria na modalidade de arrendamento por exemplo, ou que enquanto proprietário teria, é certo, mas sob um bem que viria a ser seu.

 

 

Janeiro 2020

 


 

[1] Artigos 2.º e 7.º do Decreto-Lei 1/2020, de 9 de Janeiro.

[2] Valor Total ou Parcial da caução prestada.

[3] Não basta que as partes se encontrem no imóvel para assinar o contrato, neste caso, têm de recorrer a notário ou advogado para assegurar o cumprimento das formalidades associadas ao contrato.

[4] Artigo 17.º do DL 1/2020, de 9 de janeiro.

[5] Artigo 18.º do DL 1/2020, de 9 de janeiro.

[6] Artigo 8.º do DL 1/2020, de 9 de janeiro.

[7] Não obstante, o morador poderá utilizar parte da habitação para outro fim, desde que para tal existe previsão contratual ou autorização prévia por parte do proprietário – v. artigo 9.º do DL 1/2020, de 9 de janeiro.

[8] Artigo 10.º, n.º 2 do DL 1/2020, de 9 de janeiro.

[9] Em comparação com o regime de arrendamento urbano.