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March 1, 2022

Revisão do regime de propriedade horizontal

CIVIL LAW
Revisão do regime de propriedade horizontal

 

Foi aprovada a Lei n.º 8/2022, publicada no passado dia 10 de janeiro (“Lei”), que revê e introduz alterações relevantes ao regime da propriedade horizontal, alterando, simultaneamente, o regime da propriedade horizontal no Código Civil (“CC”), no Decreto-lei n.º 268/94, de 25 de outubro (“Regime da Propriedade Horizontal”) e no Código do Notariado.

A presente Newsletter pretende enunciar, de forma sucinta, as principais alterações introduzidas pela Lei[1].

 

  • Modificação do título constitutivo da propriedade horizontal – Artigo 1419.º do CC

A presente Lei introduziu uma exceção à unanimidade necessária para alteração do título constitutivo, prevendo que na falta de acordo para a alteração do título constitutivo quanto a partes comuns esta pode ser suprida judicialmente, sempre que os votos representativos dos condóminos que nela não consintam sejam inferiores a 1/10 do capital investido e as alterações não modifiquem as condições de uso ou o fim que as suas frações se destinam.

 

Encargos de conservação e fruição – Artigo 1424.º do CC

A Lei passa a prever expressamente que as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e relativas ao pagamento de serviços de interesse comum são da responsabilidade dos condóminos proprietários das frações no momento das respetivas deliberações.

As despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum podem, mediante disposição do regulamento de condomínio, ser aprovadas por maioria dos condóminos que representem a maioria do valor total do prédio[2], ficando a cargo dos condóminos em partes iguais ou em proporção à respetiva fruição, desde que sejam devidamente especificados e justificados os critérios que determinam a sua imputação.

Outra alteração neste tópico prende-se com o facto de caso o estado de conservação das partes comuns, destinadas ao uso exclusivo de um dos condóminos, afete o estado de conservação ou o uso das demais partes comuns do prédio, o condómino a favor de quem está afeto o uso exclusivo daquelas apenas suporta o valor das respetivas despesas de reparação na proporção indicada, salvo se tal necessidade decorrer de facto que lhe seja imputável.

 

Responsabilidade por encargos do condomínio – Artigo 1424.º-A do CC e artigo 54.º do Código de Notariado

Uma das principais novidades da presente Lei é a previsão da obrigatoriedade da declaração sobre encargos e dívidas do condomínio da responsabilidade do condómino em caso de alienação da fração por parte do proprietário[3].

Assim, em caso de alienação de uma fração autónoma, o condómino para efeitos de celebração de contrato de alienação, deverá requer ao administrador a emissão de declaração escrita da qual conste:

  1. O montante de todos os encargos de condomínio em vigor relativamente à sua fração, especificando a sua natureza, montantes e prazos de pagamento;
  2. Caso existam, referência às dividas existentes, respetiva natureza, montantes, datas de constituição e vencimento.

Note-se que o referido documento constitui um documento instrutório obrigatório da escritura ou do documento particular autenticado de alienação da fração em causa[4].

Neste sentido, a responsabilidade pelas dívidas existentes é aferida em função do momento em que a mesma deveria ter sido liquidada, salvo se o adquirente expressamente declarar na escritura ou documento particular autenticado que titule a alienação da fração, que prescinde da declaração do administrador e aceita em consequência a responsabilidade por qualquer divida do vendedor ao condomínio[5].

 

  1. Reparações indispensáveis e urgentes – Artigo 1427.º do CC

A Lei inclui agora uma definição sobre reparações indispensáveis e urgentes, sendo estas as reparações necessárias à eliminação, num curto prazo, de vícios ou patologias existentes em partes comuns que possam, a qualquer momento, causar ou agravar danos no edifício, ou em bens, ou colocar em risco a segurança das pessoas.

 

  1. Assembleia de condóminos
  2. Convocatória e funcionamento – Artigos 1431.º, 1432.º do CC e Artigo 1.ª-A do Regime da Propriedade Horizontal

A presente Lei vem prever uma exceção à regra geral de realização da primeira reunião anual de condomínio no mês de janeiro, podendo esta excecionalmente realizar-se no primeiro trimestre de cada ano[6].

A convocatória passa a poder ser efetuada através de correio eletrónico para os condóminos que manifestem essa vontade em assembleia de condóminos realizada anteriormente, devendo a manifestação de vontade ficar lavrada em ata com a indicação do respetivo endereço de correio eletrónico[7].

As assembleias de condóminos nas quais não compareçam o número de condóminos suficientes, e não tiver sido fixada nova data, poderão realizar-se 30 minutos depois da hora inicialmente agendada, no mesmo local, se decorrido o tempo houver condições para garantir a presença de condóminos que representem um quarto do valor total do prédio.

Uma alteração fundamental é a previsão da realização da assembleia de condóminos por meios de comunicação à distância[8], sempre que a administração do condomínio assim o determine ou a maioria dos condóminos assim o requeira[9].

 

  1. Ata da Assembleia de Condóminos – Artigo 1.º do Regime da propriedade horizontal

A Lei prevê agora a subscrição e assinatura digital das atas[10].

A Lei passa, também, a prever expressamente que a ata deverá conter um resumo do essencial da assembleia de condóminos, indicando, também:

  • Data e local da reunião;
  • Condóminos presentes e ausente;
  • Os assuntos apreciados;
  • As decisões e deliberações tomadas com o resultado de cada votação;
  • Indicação de a ata ter sido lida e aprovada.

 

Funções do administrador – Artigo 1436.º do CC

Foram aditadas e reforçadas as funções do administrador do condomínio, onde destacamos as seguintes:

  1. Emitir declaração de dívida do condomínio, no prazo máximo de 10 dias, sempre que seja solicitado para efeitos de alienação da fração;
  2. Intervir em todas as situações de urgência que o exijam, convocando de imediato assembleia extraordinária para ratificação da sua atuação;
  • Exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas, incluindo os juros legais devidos e as sanções pecuniárias[11].

Para além das funções do administrador serem reforçadas a Lei ainda prevê expressamente:

  • A obrigação do administrador de condomínio de apresentar pelo menos três orçamentos diferentes, perante a necessidade de realizar obras de conservação extraordinária, ou que constituam inovações nas partes comuns[12];
  • Que o administrador de condomínio que não cumprir as funções que lhe são cometidas pela lei ou em deliberações da assembleia de condóminos é civilmente responsável pela sua omissão podendo ainda ser responsabilizado criminalmente.

 

Representação do condomínio em juízo – Artigo 1437.º do CC

A Lei prevê que o condomínio é sempre representado em juízo pelo seu administrador.[13]

Note-se que a apresentação pelo administrador de queixa-crime relacionadas com as partes comuns não necessita de autorização da assembleia de condóminos.

 

  1. Informações a serem prestadas ao administrador de condomínio – Artigo 3.º do Regime da Propriedade Horizontal

A Lei passa a prever uma série de informações que os condóminos devem prestar ao administrador de condomínio, tais como:

  • Informação sobre número de contribuinte, morada, contatos telefónicos e endereço de correio eletrónico[14];
  • Obrigação de comunicação da alienação de uma fração ao administrador do condomínio pelo condómino alienante[15]/[16];

 

  1. Fundo Comum de Reserva – Artigo 4.º do Regime da Propriedade Horizontal

A Lei prevê agora que caso, por deliberação da assembleia de condóminos, o fundo comum de reserva seja utilizado para fim diverso de custear despesas de conservação do edifício, os condóminos são obrigados a assegurar o pagamento de quotização extraordinária para reposição do montante utilizado, no prazo máximo de 12 meses.

 

  1. Dívidas por encargos dos Condóminos e Título Executivo – Artigo 6.º do Regime da Propriedade Horizontal

A Lei continua a prever que a ata da reunião da assembleia de condóminos[17], constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.

Contudo, a Lei prevê agora expressamente que, para além do capital em dívida, se encontram abrangidas pelo título executivo os juros de mora, à taxa legal, das obrigações assumidas, bem como sanções pecuniárias[18].

Realce-se ainda que o administrador deve instaurar ação judicial de cobrança no prazo máximo de 90 dias desde o primeiro incumprimento do condómino, salvo deliberação em contrário da assembleia de condóminos e desde que o valor em dívida seja superior ao valor do IAS do respetivo ano civil.

 

  1. Entrada em vigor da Lei

A presente lei entra em vigor 90 dias após a data da sua publicação, ou seja, entrará em vigor a 10 de abril de 2022, com exceção do artigo 1437.º do CC, que entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

 

Lisboa, 16 de fevereiro de 2022.

 

 

 

[1] Para informação mais detalhada sobre a Lei recomenda-se a leitura da mesma e/ou a consulta de um Advogado.
[2] Na redação anterior previa-se maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.
[3] Isto vai ao encontro de uma das novas funções do administrador de condomínio que deverá emitir no prazo máximo de 10 dias úteis a referida declaração para efeitos da alienação da fração.
[4] Na sequência destas alterações, o Código do Notariado, também, sofreu uma alteração, no sentido de referir que os instrumentos pelos quais se partilham ou transmitem direitos sobre prédios, ou se contraiam encargos sobre eles, não podem ser lavrados sem que se faça referência à declaração referida.
[5] Adicionalmente, os montantes relativos a encargos e/ou dívidas do condomínio que tenham data de vencimento posterior à transmissão, são da responsabilidade do novo proprietário.
[6] Esta exceção tem que estar prevista no regulamento do condomínio ou resultar de deliberação aprovada por maioria da assembleia de condóminos.
[7] O condómino deve enviar recibo de receção do e-mail convocatório.
[8] Preferencialmente por vídeo conferência.
[9] Contudo, note-se que a Lei prevê que caso algum condómino não tenha, fundamentadamente, condições para participar na assembleia de condóminos por meios de comunicação à distância, compete à administração do condomínio assegurar-lhe os meios necessários, sob pena de a assembleia não poder ter lugar através daqueles meios.
[10] Através de assinatura eletrónica qualificada ou por assinatura manuscrita, aposta sobre o documento original ou sobre documento digitalizado que contenha outras assinaturas.
[11] Que tenham sido fixadas pelo regulamento do condomínio ou por deliberação da assembleia.
[12] Desde que o regulamento de condomínio ou a assembleia de condóminos não disponha de forma diferente.
[13] O administrador age em juízo no exercício das funções que lhe competem, como representante da universalidade dos condóminos ou quando expressamente mandatado pela assembleia de condóminos.
[14] Os condóminos devem atualizar tais informações sempre que as mesmas sejam objeto de alteração.
[15] Comunicação que deverá ser realizada por correio registado expedido no prazo máximo de 15 dias a contar da mesma, devendo a informação conter o nome completo e o número de identificação fiscal do novo proprietário.
[16] A falta de comunicação responsabiliza o condómino alienante pelo valor das despesas inerentes à identificação do novo proprietário e pelos encargos suportados com a mora no pagamento dos encargos que se vencerem após a alienação.
[17] A ata em questão deverá conter o montante anual a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respetivas obrigações.
[18] Desde que estas sejam aprovadas em assembleia de condóminos previstas no regulamento de condomínio.

O presente documento destina-se a ser distribuído entre clientes e colegas e a informação nele contida é prestada de forma geral e abstrata, não devendo servir de base para qualquer tomada de decisão sem assistência profissional qualificada e dirigida ao caso concreto. O seu conteúdo não pode ser reproduzido, no seu todo ou em parte, sem a expressa autorização do(s) editor(es). Caso deseje obter esclarecimentos adicionais sobre este tema contacte Henrique Soares Santos ou Yara Gomes Santos (hss@vma-associados.com /ygs@vma-associados.com ).